Onde está você agora, além de aqui dentro de mim?

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Sinto falta de conexões profundas. Daquelas que mal se sabe e não se pode descrever. Das tardes no parque, dos abraços longos, serenatas simples, corações abertos e músicas temas. Daquelas que se guarda partes e não se quer jamais esquecer, para contar aos netos e ao mundo, e chorar lembrando. Que brota do nada e quando parte dói, levando consigo uma infinidade de momentos que nunca puderam existir e fazendo temer, como nunca antes, o esquecimento e a solidão. Permanecendo algumas memórias sortidas, daqueles cabelos ruivos, contornos sinuosos, as mãos tão macias quanto o beijo, a voz rouca que embalava e os abraços na qual, se pudesse, moraria. Coleção de traços daqueles que um dia foram meus amantes e puderam possuir os mais belos fragmentos de mim. Das cartas e poesias trocadas, canções adotadas, vontade de estar ali pra sempre... E planejar o reencontro e reviver os dias, só pra se sentir aquecida de novo e ir dormir sorrindo. Que é sempre nova, não importa quantas outras já tenha vivido, te tira o foco e o equilíbrio da forma mais gostosa possível, com os arrepios, expectativas e borboletas na barriga. E se pudesse voltaria, revisitaria todos os amores vividos, em seus melhores momentos de plenitude. Mas se contenta, então, com os saudosismos nostálgicos, que um dia foram amor, todos guardados lado a lado, com seus diferentes aromas e nomes, no mais íntimo pedaço daquilo que é memória, mas principalmente sentimento.

Parêntese

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Quando não transborda é difícil escrever. Quando não é vazamento, quando é quadrado. Talvez só meus textos passionais sirvam de algo, mesmo que seja apenas me esvaziar. Não tenho bem um raciocínio certo sobre minhas linhas tortas e embora quisesse saber falar bonito, só sei soar como eu mesma, o que implica num léxico meio limitado. Sei que posso parecer confusa, mas é por só saber escrever quando é avalanche e avalanches não são muito controláveis. Vira tudo um fluxo bagunçado que eu tento fazer ter sentido. Acho que começo, meio e fim nem são assim tão interessantes, a graça de verdade está em tentar entender quando se falta um pedaço. Histórias contadas inteiras e detalhadas só servem de algo quando se mostram incompletas. O verdadeiro objetivo de uma história é ser contada, afinal. São tantas as histórias a serem contadas, vividas, lembradas... Espero que no fim não fiquem presas em mim, sem ter para onde ir, sem ter quem fazer sentir. Talvez essa seja a real graça de viver, escrever e ser, saber que pelo menos uma parte de tudo não vai ficar presa em você, vai ser lembrada e revivida A memória é algo engraçado, uma espécie de universo paralelo onde os momentos se repetem infinitamente em sua grandiosidade. Embora acabem se modificando com o tempo, não deixam de existir e ter essa magia de parecerem imutáveis. Talvez a grande graça de existir seja só poder viver tudo uma vez. Clichê, eu sei, mas é preciso admirar a beleza da singularidade temporal. Alguns momentos são tão bons que dói lembrar que se transformaram em memórias e de lá não mais sairão, mas se pudéssemos revivê-los ilimitadamente, talvez perdessem o brilho, ou só não fossem tão especiais quanto são por terem deixado de existir. Essa é uma questão relativa, admito, não sei bem qual meu conceito de existência para definir quando algo se enquadra ou não nele. Essa questão toda de consciência e percepção é bem engraçada, inclusive, já que não conheço termo melhor para defini-la, acaba gerando um daqueles nós absurdos de cabelo, mas na nossa cabeça. Memória, tempo, percepção, consciência... Tudo muito engraçado, muito indefinível. Talvez devesse controlar um pouco mais esses meus devaneios e vícios de linguagem, ambos tão particulares de mim.

Coletânea

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Certa vez fizemos uma aposta em relação a quanto tempo demoraria pra um enjoar do outro. Eu ganhei. Mas a verdade é que nunca imaginei que você enjoaria tão rapidamente de mim. Era pra ser só mais uma data jogada ao vento, seguindo aquilo de "tempo de experiência", como se estivéssemos testando as possibilidades do que viríamos a ser.
Esses meses passaram, mas foi a única coisa a ter um real fim, já que não podemos controlar o tempo. Acho que ficou claro nas entrelinhas daquela conversa calma que tivemos, sobre um fim que soava como pausa, um tempo que soava como uma lacuna. 

Embora eu não saiba cantar assim tão bem (como você), queria poder cantar tudo aquilo que nunca cheguei a dizer. Gosto tanto das palavras, é fato, mas as vezes elas me faltam. Ainda bem que muitas vezes alguém já externou tudo aquilo que eu gostaria, ou chegou bem perto disso.

Eu só quero que você saiba que estou pensando em você, agora e sempre mais. Eu só quero que você ouça a canção que eu fiz pra dizer que eu te adoro cada vez mais e que eu te quero sempre em paz. Tô com sintomas de saudade, tô pensando em você, como eu te quero tanto bem. Aonde for não quero dor, eu tomo conta de você, mas te quero livre também, como o tempo vai e o vento vem.

A lua estava linda naquela noite. Brilhante. Desliguei minha luminária, como se não tivesse medo do escuro, e olhei através da janela, para as nuvens e as poucas estrelas. Deitei para admirar as sombras da grade e da janela em minhas pernas, no edredom, com sua curvas, suas listras, todas as formas e tons de cinza. Lembrei de você, será que também olhava para a lua? 

Por que o quarto está tão frio? Você virou de costas em seu lado, será que só chego na hora errada? Nosso respeito some rapidamente, mas ainda há essa atração que mantivemos ao longo da vida. É, o amor vai nos dilacerar novamente. 

E você dizia que nosso encontro, nosso beijo, não tinha sido algo fácil, que vinte anos pra me encontrar não era exatamente seu conceito de fácil. As outras é que foram mais azar do que sorte, é verdade.

Pare e espere um segundo. Quando você olha assim pra mim, amor, o que você espera? Eu provavelmente continuo te adorando com suas mãos ao redor do meu pescoço, ou ao menos adorava na última vez em que chequei.

"Mamihlapinatapai": aquele momento (ou sentimento), em que duas pessoas querem iniciar algo, mas nenhuma das duas quer tomar a iniciativa.

No meio daquela turbulência, eu olhava despretensiosamente as fotos em minha galeria. Passei por uma sua. Parei. E sorri.

Não sei explicar, mas quero tentar. Existe essa imagem de você e eu, que vai dançando pela manhã e à noite. Existem todos esses lugares onde costumávamos ir e eu suspeito que você já saiba, mas aquele lugar que você gostava na rua das lembranças, mesmo que pareça igual, está mudado.

Naquele dia deu pra escutar a canção que tocou pra gente e o meu coração que de repente inventou de sapatear. Não era lá das melhores músicas, mas serviu pra darmos boas risadas e interromper nosso primeiro beijo, mesmo que por pouquíssimo tempo. Ventava e era o primeiro dia do outono, algo muito mais romântico do que o que planejávamos, é verdade. E mesmo que soubesse tudo o que viria depois disso, não mudaria de ideia, não deixaria de ir.

E eu nem vi quando você espetou sua casa aqui, quando você espalhou seu suor em mim, ameno. Ainda faz um tempo bom pra desperdiçar comigo, podemos enfeitar domingos... Você é um sonho bom, que mudou o tom da minha vida, comprida. Pode ser o seu cabelo, ou o jeito que você anda, pode ser o sol da tarde e essas coisas que ele traz, dada a minha intensidade ou a calma do seu mundo. Um dia eu vou ficar bem, só pra te querer mais, onde quer que eu ande bem, domingo é pra te dar paz. 

Então, ela colocou seu coração em uma sacola, ele não o pediria de volta, não queria vê-la chorar, ela não queria estar triste, então disse "é bom que não me deixe". Aquela coisa estaria ferrada por dias e semanas e meses, mas... "Eu me apaixonei hoje e não há palavras que você possa dizer que possam fazer com que eu mude de ideia".

Eu acho que soo idiota quando chamo seu nome, mas talvez você o ouça em sua cabeça o dia inteiro, talvez você perceba que só está se agarrando a esperança de que eu talvez não demonstre mais meus sentimentos. Parece que só regredimos, amor.

Mas tudo bem, o dia vai raiar pra gente se inventar de novo.



Desordem

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Parte 1 

Sempre achei completamente natural a figura proveniente de uma mistura entre cabeça e coração em suas formas metafóricas. Meu quarto é igualzinho a minha cabeça-coração. Uma zona. Quando fecho por muito tempo, sobe um cheiro estranho, mas quando deixo aberto por tempo demais, fica gelado. O chão já está coberto por camadas de coisas importantes e desimportantes que não sei mais diferenciar com clareza e embora finja que sei onde estão, as vezes desisto de umas por preguiça de procurar. A cama raramente sai de seu estado zoneado, como se alguém acabasse de levantar dela extremamente atrasado e com pressa, o que realmente acontece com certa frequência. Ela também está sem lençol, sem fronhas, com algumas coisas jogadas perto da cabeça, que funcionalmente é o pé. Nem a cômoda conseguiu se manter decente, o espelho tem sua frente coberta por tranqueiras até a metade, o gaveteiro semi aberto com coisas escapando dele, assim como acontece com as gavetas. Alguns livros lidos pela metade, alguns sapatos fora de uso, alguns pares de meias sujas, alguns conjuntos de problemas inventados. Ele está sem luz, o que não ajuda muito a manter a ordem. Embora tenha aceitado o caos como parte minha, fica difícil querer permanecer dentro de um cômodo tão caótico. É sufocante saber que isso é a materialização de quem eu sou.

Parte 2 

Hoje arrumei meu quarto. Ainda não achei exatamente uma definição pro efeito que isso teve sobre mim, mas sei que foram as três horas cansativas mais aliviantes dos últimos meses. A cama agora tem roupa, as gavetas já não mais explodem, o espelho é visível, os livros passaram a ser levados ocasionalmente na bolsa para que os leia, os sapatos foram todos guardados e as camadas de coisas, apesar de ainda existirem, agora tem uma real organização na qual não me perco. Sem mais roupas sujas, travesseiros manchados de maquiagem, papéis indefinidos jogados para todos os lados e tropeções nos obstáculos. Não há muita coisa que eu possa fazer em relação ao frio que ocasionalmente surge, mas não é como se estivesse fazendo qualquer tipo de calor em algum lugar por aí. Continuamos sem luz, é verdade, mas esse também é um problema que está além de meu controle e aprendi recentemente a não insistir nesse tipo, posso só aproveitar as escassas horas de luz do Sol e talvez aprender a não ter mais medo do escuro. Agora consigo efetivamente dizer, sem me sentir hipócrita, que gosto do meu quarto, do meu desarrumado, ninguém sabe mexer na minha confusão. É verdade, não mais uma mentira poética. Passei algumas várias horas dentro dele, em minha cama quente e aconchegante, nos últimos dias. É reconfortante saber que agora não preciso recorrer ao quarto dos meus pais, pois posso fugir para ele, o meu, e não fugir dele. Arrumei até mesmo as roupas de frio que ficam naquela prateleira quebrada. Li umas cartas antigas de amor, troquei a roupa de uma barbie e organizei por cor as roupas nas gavetas. Reconheço que isso não deve durar muito, nunca dura, mas é boa a sensação de conforto e acolhimento ao estar dentro de mim mesma, quer dizer, dentro do meu quarto, do meu espaço.

São Bernardo do Campo, 27 de Maio de 2016

Ei mocinho,
Faz frio lá fora. Poderíamos estar agora assistindo àquele filme abraçados debaixo das cobertas, como combinamos um dia. Ironicamente, acabei de assistir sim a um filme, debaixo das cobertas, mas com os pés gelados por estarem apoiados no chão e sem você, a parte da cena que realmente me importa. A parte mais dolorosa foi não poder te contar o que achei do filme. Não era o nosso, o combinado, mas era bonito, apesar de bobinho. Enquanto os créditos passavam pela tela, eu chorava e sorria, boba, com os dedos prontos para desbloquear o celular e te descrever o que sentia. Mas não podia. Ultimamente, inclusive, sinto que não posso muita coisa, não com você. Dói. Adquiri essa mania de ler coisas antigas, ver coisas antigas, pensar no que já foi... Fico perdida entre tantas memórias. Aparentemente acabei desistindo da situação presente, não sei mais como lidar, como resolver, como prosseguir. Então me vi presa ao que sinto, ao que passamos, porque isso não muda. Lembro que um dia ouvi alguém reclamar do calor e dizer que o frio chegaria. Escrevi um texto sobre nós dois e sobre como as coisas continuariam quentes, mesmo depois da chegada da frente fria. Ironicamente, errei. Alguma parte de mim gostaria de culpar essa espécie de efeito borboleta, dizendo que as coisas só estão assim agora porque esfriou naquele dia. Soa ridículo, eu sei, mas sou toda meio ridícula, você sabe. Já não sei mais nem o propósito do que escrevo, não é como se externar pensamentos desconexos fosse fazer alguma coisa melhorar. Falando em melhorar, andei trabalhando nisso. Não pude te contar detalhes sobre, afinal qualquer assunto vem sendo desconfortável e aparentemente inoportuno, mas estou melhor. Trabalhei naqueles problemas todos, resolvi alguns, outros arquivei, para serem resolvidos quando chegar a hora. Você provavelmente foi o único que continuou no limbo, sem solução e sem que eu consiga deixar de lado. Tentei, você viu, mas já quero integralmente que paremos com isso. Te deixar de lado, de onde exatamente tirei essa ideia?!? Que erro. Bom, acho que vou terminando agora, pra voltar a pensar em coisas que poderiam ter dado certo, que fariam dar certo agora, que são mais agradáveis e menos dolorosas do que o real momento de nós dois. Hoje faz quatro semana, inclusive, e não sei dizer se parecem quatro horas ou quatro anos, mas que poderiam só acabar, pra eu parar de sentir essa enorme... coisa. É, o dia dos namorados tá chegando, você me lembrou disso hoje, aparentemente sem propósito. Pensei nas formas que gostaria de passá-lo, mas lembrei que nunca nem chegamos a ser um casal de namorados. Provavelmente o passarei como vim passando esse feriado: com frio, assistindo romances e chorando enquanto vasculho o passado. Espero que não seja tão ruim quanto soa.
Sinto sua falta,
Até mais.
Obs.: seu silêncio me ensurdece